Para combater o desmatamento é preciso uma ação efetiva do Estado

30/09/2021

Senado promove debate sobre o desmatamento entre ambientalistas, pesquisadores e setores produtivos da pecuária e agricultura

Audiência comprova omissão do Governo Federal no controle de incêndios e desmatamento

Na esteira dos debates e análises sobre a política climática do Brasil junto ao Senado Federal que o IDS vem propondo e articulando em parceira com organizações que compõem a RAC – Rede de Advocacy Colaborativo, aconteceu nessa sexta-feira (1 de out) a realização de audiência pública na Comissão do Meio Ambiente (CMA).

O objetivo foi tratar as políticas de prevenção e controle de desmatamentos e queimadas nos biomas Amazônia, Cerrado e Pantanal para identificar as falhas, omissões e propor recomendações. A senadora Eliziane Gama Cidadania/MA é a relatora do processo de avaliação.

Ao final desses encontros, um documento com propostas será elaborado para ser apresentado durante a COP26, que acontece em novembro em Glasgow, na Escócia.

Outros debates já aconteceram no mês de agosto e ouviram lideranças ambientais, representantes do governo federal e parlamentares. De acordo com André Lima, consultor em políticas públicas do IDS e coordenador do projeto Radar Clima e Sustentabilidade, “os eventos fazem parte da avaliação da política de clima que propusemos em parceria com outras organizações socioambientais da sociedade civil que colaboraram com um plano de trabalho a ser apresentado aos senadores e sociedade”, disse. É um trabalho longo que vem sendo desenvolvido desde 2019, segundo ele.

A audiência dessa sexta-feira (1 de out) teve a participação de representantes da Embrapa, do  Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM), do Instituto de Estudos Avançados (IEA) da USP, do Centro de Sensoriamento Remoto da UFMG, da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil – CNA, da Associação Brasileira do Agronegócio – ABAG entre outros.

Deter quem risca o fósforo!

Ane Alencar, do IPAM, afirmou que para lidar com o desmatamento na Amazônia, em suma, tem que conter quem risca o fósforo. Segundo ela, às vezes o uso indevido do fogo para manejo provoca incêndios florestais, os últimos dados obtidos mostram que a curva do fogo é alta. “Já os dados de janeiro a setembro dos últimos 5 anos apontam que a chuva ajudou bastante a região para reduzir a presença do fogo, mas o desmatamento, a partir de 2019, entrou em outro patamar. A área desmatada na Amazônia foi de 11.088 km quadrados entre agosto de 2019 e julho de 2020 de acordo com o INPE. Aumentou muito a extensão das áreas desmatadas pelas imagens de satélite retiradas do MapBiomas e o pior é perceber que a grande maioria delas estão localizadas em áreas protegidas, Terras Indígenas (TI) e Unidades de Conservação (UC). São terras públicas federais”, disse Ane. “Se houvessem iniciativas de combate só nesses locais a gente já conseguiria reduzir muito o desmatamento. Isso não deveria ser aceito pela sociedade brasileira”, lamentou.

Além disso, a pesquisadora mostrou a importância de se realizar com maior rapidez a homologação das Terras Indígenas para que não haja a sobreposição de CAR -Cadastro Ambiental Rural nessas áreas, o que demonstra claramente a intenção de grilagem nesses territórios. “As politicas climáticas precisam ser revisitadas e o CAR é um instrumento importante para enquadrar os que não seguem a legislação ambiental”, afirmou. Ela destacou também a extrema necessidade de retomar o PPCDAm, o maior plano de combate ao desmatamento na Amazônia que já existiu, algo que até ajudaria na recuperação da imagem do agronegócio. Em suma, consolidar economias de base florestal e conservação de ativos entre outras providências.

Ponto de Não Retorno

Carlos Nobre do IEA / USP, lembrou o Relatório do IPCC recém lançado, onde fica evidente a ocorrência de eventos climáticos extremos ultrapassando o limite e a variabilidade natural do sistema climático, algo que é decorrente do aquecimento global e das emissões de gases de efeito estufa promovidas pelos seres humanos. Para ele, isso são danos que já estão aí e que precisamos lidar, não é algo que vá mudar. Ou seja, precisamos com muita urgência criar políticas de convivência com essa realidade. As metas do Acordo de Paris estão distantes hoje, mas temos diante de nós desafios que já estão postos”, afirmou. Nobre contou que em 2009 o Brasil assumiu o seu pioneirismo na COP 15 onde propôs a redução das emissões que se tornou o marco legal aprovado pelo Congresso em 2010 com 80% de redução do desmatamento na Amazônia e 40% no Cerrado até 2020. “O menor ano de desmatamento até hoje foi em 2012 e estamos hoje muito distantes do patamar indicado naquela época – que era de 4 mil KM quadrados de desmatamento, batendo na casa dos 11 mil KM quadrados conforme a Ane indicou”, disse.

Além disso, outro dado relevante segundo o professor Carlos Nobre é que enquanto as emissões globais caíram 7% em 2020, o Brasil foi um dos únicos países do mundo que aumentou suas emissões em plena pandemia do ano passado e isso deve piorar em 2021 com o agravamento da crise hídrica e também pelo acionamento de todas as termelétricas que são as mais poluentes em gases de efeito estufa. “Atingir o Acordo de Paris é um desafio global, talvez o maior desafio da Humanidade em nosso tempo, que é reduzir as emissões globais em 50% até 2030 e a Amazônia tem um papel decisivo nisso, uma vez que ela ainda detém uma grande capacidade de reter carbono no solo e na vegetação, embora isso esteja mudando. Se não conseguirmos zerar o desmatamento e as queimadas, o sul da Amazônia poderá se perder em degradação nos próximos 20 anos”, alertou.

Inibir atividades ilegais

Felipe Nunes, pesquisador da UFMG, apresentou dados sobre as consequências devastadoras do desmonte institucional das políticas de fiscalização e de combate ao desmatamento no Brasil. Além de citar a importância de se retomar o PPCDAm, que foi descontinuado, ele também destacou a ocorrência de queda no pagamento e nos julgamentos dos autos de infração julgados pelo IBAMA. No passado, a criação de Unidades de Conservação, fiscalização, controle fundiário, corte de crédito foram essenciais. Agora, segundo ele, será preciso retomar o PPCDAm, e dar continuidade ao mix de políticas baseadas no controle e monitoramento das infrações que funcionava até pouco tempo atrás. Uma das orientações do professor Nunes é apoiar os estados, que estão cumprindo o vácuo deixado pelo IBAMA ultimamente, para que os ganhos na governança ambiental sejam permanentes. “A redução do desmatamento reduz os impactos negativos na produtividade agrícola e é determinante para que haja equilíbrio climático”, disse.

Mas temos algumas saídas: precisamos de uma mudança radical de atitude, uma visão que valoriza a floresta em pé e a construção de uma bioeconomia é fundamental! É possível ter uma pecuária muito mais produtiva e agricultura regenerativa. Precisamos dialogar com urgência para entender a gravidade do problema e agir. Nossa recuperação econômica depende de ações que cessem o desmatamento no Brasil.

Para saber o que já foi discutido até aqui, acesse a cobertura da primeira audiência no dia 20 de agosto na CMA e a audiência na CTFC – Comissão de Transparência, Governança, Fiscalização e Controle e Defesa do Consumidor, também no Senado Federal.

Confira abaixo a transmissão ao vivo de hoje:

Tv Senado transmitiu a audiência pública

Leia também:

Desmatamento Zero: essa é a meta!

A Amazônia vai pautar as eleições em 2022

A Lei mais Urgente do Mundo!

Especialistas pedem mais fiscalização e alertam para desmatamento e queimadas na Amazônia

Cientistas apontam negligência nas políticas ambientais do governo Bolsonaro

Parceiros