Na COP30, IDS debate transição econômica sustentável com foco em inclusão e justiça social

18/11/2025

O evento Transição ESG: Combatendo Desigualdades e Mudanças Climáticas, que aconteceu no dia 17 de novembro no Pavilhão da OPEN SOCIETY na COP30, ofereceu um novo olhar sobre os desafios e oportunidades do Brasil na jornada rumo a uma transição econômica verdadeiramente sustentável. Organizado pelo Instituto de Democracia e Sustentabilidade (IDS) em parceria com o Instituto de Estudos Avançados da USP, o encontro interpretou a sigla ESG (Environmental, Social, and Governance) para uma provocativa “Economic Sustainable Green Transition”. Essa redefinição não é meramente semântica, ela ressalta que o cerne da questão reside na profunda transformação de nossa economia, colocando a sustentabilidade e a inclusão no centro do modelo de desenvolvimento.

Sob a medição de Caio Magri, diretor-presidente do Instituto Ethos e vice-presidente do Conselho Deliberativo do IDS, especialistas de diversas áreas convergiram em um ponto crucial: qualquer transição verde no Brasil, para ser legítima, eficaz e duradoura, precisa endereçar as profundas desigualdades sociais que historicamente marcam o país. A pauta, portanto, não é apenas ambiental, mas, intrinsecamente, social e econômica, desafiando a visão fragmentada que por vezes permeia as discussões sobre sustentabilidade.

A apresentação do relatório “Diálogos Setoriais para uma Transição Econômica Sustentável”, conduzida por Carolina Mattar, diretora executiva do IDS, serviu como o motor central do debate. O estudo, fruto de uma série de escutas qualificadas com a sociedade civil, academia e o setor produtivo, propõe um mapeamento de caminhos e estratégias para engajar múltiplos setores na corresponsabilidade climática. Essa abordagem multissetorial é fundamental para garantir que as soluções propostas sejam robustas, inclusivas e adaptadas às realidades locais.

Mattar enfatizou que a transição deve ser vista como uma oportunidade para “corrigir desigualdades históricas, estruturais, no Brasil e no mundo”, alinhando-se diretamente ao conceito de “Just Transition”, uma transição que não deixa ninguém para trás. O relatório englobou sete setores cruciais para a economia brasileira – energia, transporte, agricultura e pecuária, saneamento (com foco em resíduos sólidos), reflorestamento, construção civil e indústria têxtil. A escolha desses setores se justifica por seu alto impacto nas emissões de gases de efeito estufa ou por seu vasto potencial para a descarbonização e geração de valor socioeconômico.

Entre os avanços citados, o Plano de Transformação Ecológica do Ministério da Fazenda e a Taxonomia Sustentável Brasileira despontam como instrumentos promissores. O Plano visa mobilizar investimentos públicos e privados para a economia verde, enquanto a Taxonomia busca fornecer um sistema de classificação claro para atividades econômicas sustentáveis, direcionando o capital financeiro para onde ele é mais necessário e evitando o greenwashing.

No entanto, os desafios são gigantescos. No setor de energia, o dilema entre segurança energética e a exploração de petróleo na Foz do Amazonas exemplifica a tensão entre o desenvolvimento econômico de curto prazo e a proteção ambiental de longo prazo, com implicações significativas para ecossistemas sensíveis e comunidades tradicionais. Já na agricultura e pecuária, que responde por 27% das emissões brasileiras, a necessidade é de uma revolução que integre soluções como a agricultura digital – para otimização de recursos e redução de insumos – e sistemas agroflorestais (SAFs), que combinam árvores com culturas agrícolas e pecuária, promovendo a recuperação de solos, a biodiversidade e a segurança alimentar, especialmente para a agricultura familiar. A pressão por desmatamento e o uso intensivo de fertilizantes também representam obstáculos significativos que demandam políticas e incentivos robustos.Entre os avanços citados, o Plano de Transformação Ecológica do Ministério da Fazenda e a Taxonomia Sustentável Brasileira despontam como instrumentos promissores. O Plano visa mobilizar investimentos públicos e privados para a economia verde, enquanto a Taxonomia busca fornecer um sistema de classificação claro para atividades econômicas sustentáveis, direcionando o capital financeiro para onde ele é mais necessário e evitando o greenwashing.

No entanto, os desafios são gigantescos. No setor de energia, o dilema entre segurança energética e a exploração de petróleo na Foz do Amazonas exemplifica a tensão entre o desenvolvimento econômico de curto prazo e a proteção ambiental de longo prazo, com implicações significativas para ecossistemas sensíveis e comunidades tradicionais. Já na agricultura e pecuária, que responde por 27% das emissões brasileiras, a necessidade é de uma revolução que integre soluções como a agricultura digital – para otimização de recursos e redução de insumos – e sistemas agroflorestais (SAFs), que combinam árvores com culturas agrícolas e pecuária, promovendo a recuperação de solos, a biodiversidade e a segurança alimentar, especialmente para a agricultura familiar. A pressão por desmatamento e o uso intensivo de fertilizantes também representam obstáculos significativos que demandam políticas e incentivos robustos.

A voz da academia: clima, desigualdade e a essência da política

As falas dos painelistas trouxeram camadas adicionais de complexidade e perspectivas multidisciplinares. Vinícius Morais Cunha, doutorando em administração pública na FGV e pesquisador de economia política das mudanças climáticas, foi categórico: “Aquelas que são os mais vulneráveis das mudanças climáticas hoje não são os responsáveis pela construção dessa situação”. Cunha destacou como, no Brasil, uma economia de renda média com alta desigualdade, políticas de mitigação podem, paradoxalmente, acentuar a exclusão se não forem cuidadosamente desenhadas, por exemplo, ao impor custos desproporcionais a setores ou regiões já fragilizadas sem oferecer alternativas viáveis.

O pesquisador alertou para a influência de atores políticos, como a “bancada ruralista”, na flexibilização de regulamentações ambientais, sublinhando que a transição é, acima de tudo, um embate de forças políticas e econômicas. Os interesses de grupos específicos podem colidir com a agenda climática, exigindo negociação e, por vezes, confrontação. Sua tese é clara: “Clima é economia política”, “clima é política social” e “clima é política estável”. Sem democracia sólida, que garanta a participação e representação de todos os setores da sociedade, e políticas sociais robustas, que protejam os mais vulneráveis, a agenda climática corre sérios riscos de ser capturada por interesses pontuais ou de falhar em sua implementação.

Nicolas Lippolis, pesquisador e pós-doutorando da Escola de Clima da Universidade de Columbia, provocou a plateia a repensar o conceito de desenvolvimento. Ele enxergou na crescente convergência entre pauta climática e economia – impulsionada pelo barateamento das tecnologias verdes, o financiamento sustentável e a adoção de critérios climáticos no comércio internacional – um vetor de competitividade e uma oportunidade estratégica para o Brasil.

O Plano de Transformação Ecológica, na visão de Nicolas, é um “cavalo de Troia” positivo, pois, ao ser liderado pelo Ministério da Fazenda, traz a pauta ambiental para o centro da política econômica de forma inquestionável, mas, de forma sutil e estratégica, também impulsiona as questões sociais. Ele citou exemplos emblemáticos, como a pioneira taxonomia brasileira que inclui critérios raciais e regionais, reconhecendo que a sustentabilidade no Brasil não pode ser dissociada da equidade social e territorial. Mencionou também o potencial dos biocombustíveis sustentáveis para gerar produtos de exportação de alto valor agregado, indo além do etanol e explorando a bioeconomia.

Por fim, o Professor Wagner Costa Ribeiro, professor titular do programa de pós-graduação em Ciência Ambiental da USP,, reforçou que a “Transição Justa” é uma oportunidade sem precedentes para combater a desigualdade social no Brasil e no mundo. Criticando a insistência em um modelo capitalista que gera “falsas necessidades” e demanda insustentável por bens tecnológicos, ele clamou por modelos alternativos. “Em vez de nós pensarmos em produzir e aumentar a demanda […] talvez pudéssemos usar a nossa capacidade criativa […] para produzir modelos alternativos”, sugeriu, apontando para uma economia que priorize o bem-estar sobre o consumo desenfreado.

O professor defendeu o “mutirão” como uma ferramenta econômica coletiva que transcende o capitalismo, representando um modelo de cooperação e solidariedade que pode ser replicado em diversas escalas. Ele enfatizou a necessidade de que o crescimento econômico seja direcionado não para produzir mais objetos, mas para “prover acesso de qualidade e qualidade de vida para a população”, como saúde, educação e moradia. Para ele, a universidade tem um papel fundamental como catalisador desse processo, por meio de pesquisa interdisciplinar, extensão comunitária e parcerias estratégicas que traduzam o conhecimento em soluções práticas para os desafios da transição.

Uma transição multinível e plural: o caminho à frente

No debate final, as conclusões convergiram para a complexidade da tarefa, mas também para a riqueza de possibilidades. Carolina Mattar sublinhou a importância da “governança multinível”, que envolve a coordenação de ações entre os níveis federal, estadual, municipal e, crucialmente, o engajamento da economia local e das comunidades tradicionais para construir resiliência e combater desigualdades, valorizando a cultura e os ativos locais. Vinícius Morais Cunha reiterou a necessidade de uma perspectiva de longo prazo e de novos arranjos éticos para a economia, questionando o consumismo e promovendo modelos de produção e consumo mais conscientes e equitativos. Nicolas Nicoles, por sua vez, apontou para o avanço tecnológico direcionado a problemas sociais e acordos internacionais como fontes de esperança e mecanismos de alavancagem para a transição.

O Professor Wagner Costa Ribeiro, apesar dos desafios imponentes, manteve seu otimismo. Acreditando na capacidade humana de aprender e dialogar, ele ressaltou que “a dificuldade não é um problema, é uma lição” e que, embora a velocidade da transição não seja a ideal, “um mundo diferente será construído”. A resiliência e a inventividade humana, quando direcionadas para o bem comum, são forças poderosas.

O evento na COP30 deixou claro que a transição para uma economia verde no Brasil é um projeto ambicioso, que exige a articulação de políticas públicas robustas, a inovação tecnológica e social, e, sobretudo, um compromisso inabalável com a justiça social. É um convite urgente a olhar para o “S” (Social) e o “G” (Governance) de ESG com a mesma urgência e profundidade que o “E” (Environmental), redefinindo o progresso não só por métricas econômicas, mas pela capacidade de construir uma sociedade mais justa, resiliente, inclusiva e verdadeiramente sustentável para as futuras gerações.

Acesse o relatório dos Diálogos Setoriais para uma Transição Econômica Verde Sustentável aqui

Assista ao evento Transição ESG: Combatendo Desigualdades e Mudanças Climáticas na íntegra aqui.

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