As escolhas são os vetores do bem e do mal

25/05/2023

As escolhas que a advogada Rachel Biderman fez nos últimos 30 anos a levaram a se tornar uma das mais ativas militantes de causas socioambientais em organizações brasileiras e internacionais. Sua carreira passou por duas icônicas ONGs nacionais, a SOS Mata Atlântica e o Instituto Socioambiental, também foi secretária executiva do Observatório do Clima, uma organização de organizações que tornou o debate sobre a emergência climática um pauta de muita mobilização e políticas públicas. Também dirigiu por quase uma década o WRI Brasil, organização voltada para a proteção ambiental e dede 2020 está na vice-presidência sênior para a América Latina da Conservação Internacional, onde pode atuar de forma mais ampla no fomento à economia sustentável, com soluções baseadas na natureza e defesa de populações indígenas. Há muito mais em seu currículo, mas já deu para conhecer um pouco de Rachel Biderman, que também é associada ao IDS.

Nessa conversa fica explícita seu compromisso com o amanhã da humanidade e do planeta. Seu olhar aponta para uma população de 10 bilhões de pessoas na metade d século o que, a seu ver, só vai dar certo se fizermos um “freio de arrumação”. “É preciso mudar como se produz e como se consome”, explica. E essa população vai se concentrar em megacidades com alto impacto sobre o ambiente. “Na ponta da produção devemos repensar como estamos usando o solo, como estamos abusando dos ecossistemas nos entornos das cidades ou mais distantes elas estão consumindo produtos gerados pelo seu entorno e importados de todos os cantos do mundo”. Para ela a única forma de mitigar esse impacto é se todos, pessoas, empresas e poder público mudarem suas escolhas.

“As escolhas não só de produtos e serviços, mas também no campo eleitoral, quem é que eu elejo que vai fazer a diferença no município, no Congresso, quem vai ajudar a resolver essas questões ambientais e sociais”. Para Raquel Biderman a cidadania é um fator estruturante da transformação. O cidadão define seu impacto a partir de suas escolhas.

O alerta é de que não existem soluções únicas que vão resolver todos os problemas. Mesmo acreditando no poder das escolhas, ela aposta nos coletivos, na organização de muitos coletivos para escalar as mudanças. Eu sempre vou para o copo meio cheio. Em 30 anos, pude ver um avanço em muitas partes, desde legislação até sistema produtivo.” O alerta é de que deve haver uma solidariedade intergeracional. Aqueles que ainda não nasceram vão herdar o que for decidido agora.

Esse alerta tem uma direção, o hiperconsumo das atuais gerações. “A sociedade perdeu total a referência de outros valores e passou a viver o valor do consumismo”. Sua posição obedece a uma lógica clara: Não há planeta para alimentar esse consumo desenfreado para 10 bilhões de pessoas. Mas há como garantir prosperidade se a degradação parar. “Temos que desacelerar alguns processos, um deles é o abandonar do uso de combustível fóssil. Temos muita resistência, a guerra na Ucrânia mostrou que a Europa recorreu ao combustível fóssil para evitar o apagão energético. Demos alguns passos para trás. Mas a tecnologia existe, e os recursos financeiros existem para financiar a transição energética”. Outro ponto crítico é o consumo de carne, que também precisa de alternativas.

Como uma ambientalista histórica Rachel Biderman acredita que as soluções baseadas na natureza estão no centro da inovação e na garantia de uma economia verde. Para ela o desafio das mudanças climáticas só poderá ser enfrentado com a gestão eficaz de recursos naturais, regeneração de ecossistemas e a implantação de uma economia voltada para suprir necessidades reais e não o consumo perdulário.

Sua visão vai além, a agricultura também é foco de suas preocupações. “Devemos usar métodos de baixo carbono. O Brasil desenvolveu com a Embrapa vários modelos, um deles é a integração lavoura, pecuária e floresta”. Esta técnica vem sendo adotada, mas ainda não com a escala necessária. Muitas culturas, tem forte impacto ambiental pelo uso de agrotóxicos e fertilizantes, mas também pela emissão de metano, um gás com potencial estufa muito superior ao CO². em várias culturas, como o arroz, por exemplo. Nas cidades a produção de metano se dá principalmente pelo mau gerenciamento dos resíduos orgânicos e da falta de saneamento básico adequado.

Biderman defende uma mudança radical no sistema financeiro. A busca por altos retornos que move os investidores e instituições financeiras é um grande inimigo de uma economia mais enxuta e focada em processos sustentáveis. “Esses retornos de investimentos nas últimas décadas não são mais viáveis, não são compatíveis com as décadas que estão por vir, é preciso uma reorganização”. Ela aponta o sistema econômico, financeiro como um grande culpado, vilão deste modelo em que vivemos.

Em relação à Amazônia a ativista é direta: “Lá o problema é de governança e combate à criminalidade”. Ela aponta o desmatamento como um sintoma de descontrole de gestão e avanço do crime organizado. “Estamos em uma verdadeira guerra”, pontua.

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