22/08/2022
IDS Opina conversa com Jorge Abrahão, coordenador geral do Instituto Cidades Sustentáveis, membro da Comissão Estadual Paulista para os ODS e do Conselho do Instituto Ethos, organização da qual já foi presidente. Sua invejável biografia como ativista, professor e colunista passeia por organizações como o Global Reporting Initiative (GRI), ligado à ONU e o Conselho de Desenvolvimento Econômico da Presidência da República.
No Brasil, quando se fala em democracia normalmente se olha para Brasília. Na eleição para a Presidência da República e, quando muito, de governadores. O país tem 5.570 municípios, isso significa que tem o mesmo número de prefeitos e, ao menos, 7 vezes isso de vereadores. É nessas unidades da Federação que começa o ecossistema da democracia, sendo que quase 70% (cerca de 3.900) das cidades brasileiras têm menos de 20 mil habitantes, que torna o desafio de espraiar conceitos, tecnologias e direitos ainda mais desafiador. Estes dados oferecem um pouco de contexto à realidade de um país que está entre as 10 maiores economias do mundo e ainda tem indicadores de desenvolvimento social e econômico de Terceiro Mundo.
Jorge Abrahão coloca que o país não é capaz de realizar uma distribuição justa de suas riquezas e a desigualdade acabou sendo a principal chaga do Brasil. E os problemas causados por essa distorção social e econômica acabam desaguando nas cidades.
Com os retrocessos a nível federal muitas cidades têm se colocado como espaços de proteção de direitos e conquistas. Esse é um dos principais esforços do Instituto Cidades Sustentáveis, uma busca não apenas pelo fortalecimento da autonomia das cidades, mas, em muitos casos, apoiando o reconhecimento dessa capacidade de produzir e implementar políticas públicas autônomas.
Um dos problemas que as cidades, em especial os pequenos municípios, enfrentam é a falta de capacidade técnica. É difícil montar equipes com pessoas que realmente podem dar conta dos desafios. Alguns exemplos são flagrantes: 80% da educação brasileira é pública e 75% da população depende da saúde pública e esses serviços à sociedade são, em sua maior parte, responsabilidade das estruturas municipais de gestão.
A capacitação permanente, contínua, estímulo, reconhecimento dessas pessoas, a valorização desses profissionais, acho que são políticas que deveriam ser estruturantes.
Clima e Meio Ambiente
Outro ponto onde a ação dos gestores de cidades é fundamental é em temas de impactos ambientais, como a gestão de água e saneamento e políticas de redução e mitigação das mudanças climáticas. Nestes casos os avanços estão muito mais lentos do que o desejável. Os políticos de uma forma geral estão preocupados com as questões emergenciais. As urgências do dia a dia acabam canalizando todas as energias e não se tem uma visão, muitas vezes, para as questões estruturantes.
Mudanças climáticas, que muitos já tratam como emergência climática, ainda estão longe das preocupações dos gestores de boa parte das cidades. Há a percepção equivocada de que esse ainda é um tema para o futuro. É um erro não se trabalhar com políticas de médio e longo prazos, os impactos já estão produzindo tragédias em países da Europa e nos Estado Unidos, mas, também, aqui no Brasil.
As cidades podem fazer muitas coisas, a começar pelo cuidado com a cobertura vegetal, estabelecer parques e mais áreas verdes, cuidar de matas ciliares etc. Há também questões importantes ligadas à mobilidade. Boa parte da poluição do ar nas cidades vem de ônibus e caminhões, e a organização do trânsito e do transporte público é, em grande parte, uma tarefa dos prefeitos.
Uma ferramenta importante para o avanço em políticas públicas são os 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU e sua 169 metas. Eles são uma baliza para governos na medida em que apontam onde estamos e para onde devemos caminhar em questões fundamentais e estruturantes para o desenvolvimento e a qualidade de vida nas cidades. No entanto, ainda precisamos tornar os ODS mais conhecidos e acelerar o passo, porque ainda estamos muito longe das metas que têm de ser atingidas até 2030.
Para ampliar o conhecimento e o acesso de gestores públicos aos ODS, o Instituto Cidades Sustentáveis lançou recentemente uma ferramenta chamada “Índice de Desenvolvimento Sustentável das Cidades Brasileiras”, pegamos 100 indicadores e distribuímos nos 17 ODS. Conseguimos mapear como estão as 5570 cidades brasileiras em cada ODS. A ferramenta pode ser acessada através do link: https://idsc.cidadessustentaveis.org.br/ O objetivo é gerar consciência. Cada pessoa pode saber como anda a sua cidade.
Cabe à sociedade civil e ao governo de forma geral avançar nessa direção. O Brasil é o único país do mundo que está monitorando todas as suas cidades em relação aos ODS.
Democracia e Eleições
A única saída é o voto. É preciso ter critérios na escolha de candidatos, ver o tipo de preocupação que os move, desprender um pouco mais de energia para entender em quem nós estamos votando. Colocamos muita energia no voto da presidência, mas muito pouco no Congresso Nacional. E o Congresso tem um peso muito importante na democracia. Ele tem sido dominado por políticos de baixo calão.
O congresso foi sequestrado por interesses privados que nos prejudicam como sociedade. O país não está defendendo a maioria da população em favorecimento de alguns pequenos grupos.
O Deputado Federal que está no Congresso tem de ter um olhar para o país. Ele não é um sujeito que está para resolver um problema local em seu município. Isso é com prefeitos e vereadores.
É através da política que vamos transformar o país e nós temos que buscar pessoas sérias que atuem em maiores escalas e reduzam os maiores problemas do Brasil. No meu juízo você não pode eleger um candidato que despreze as mulheres ou que não reconheça o racismo no Brasil no ponto de vista da questão racial. Ou que não entenda que a Amazônia é uma questão central.
Assista a entrevista completa com Jorge Abrahão através do link:
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