4º Debate preparatório para a COP 30: Ética global – cooperação para uma transformação ecológica justa

02/10/2025

Ministra Marina Silva e especialistas definem prioridades para a COP30

O quarto e último debate do ciclo preparatório para a COP30, promovido pelo Instituto de Desenvolvimento Sustentável (IDS) em parceria com a Carta da Terra Internacional – Brasil, reuniu no dia 26 de setembro (sexta-feira), em São Paulo, especialistas, pesquisadores, ativistas, parlamentares e representantes do terceiro setor para discutir os contornos de uma transformação ecológica justa guiada por princípios éticos. O encontro, que integrou os diálogos sobre o Balanço Ético Global, foi concebido como espaço de escuta plural e produção de recomendações para a conferência que será realizada na Amazônia.

Na abertura, a diretora-executiva do IDS, Carolina Mattar, destacou a relevância do momento histórico vivido pelo país com a realização da COP30 em Belém. “Talvez graças à realização da COP no Brasil, a gente tenha essa linda oportunidade de conversar sobre essa questão tão fundamental, estruturante do nosso ser, da nossa sociedade, que é a questão da ética”, afirmou. Para ela, o evento foi pensado com “muito cuidado”, tendo a ética do cuidado como base da construção coletiva.

Ao longo do debate, painelistas ressaltaram a necessidade de mecanismos que dêem força a esse princípio. O economista e acadêmico Eduardo Giannetti ofereceu o enquadramento conceitual ao descrever a distribuição global do consumo e das emissões, afirmou que o 1 bilhão de habitantes que está no topo da pirâmide é responsável por metade das emissões de gases de efeito estufa e que os 3 bilhões e meio que estão na classe média respondem por 45% das emissões, enquanto a base da pirâmide contribui com uma fatia marginal e é a mais exposta aos impactos climáticos.

Giannetti vinculou essa desigualdade a uma falha estrutural do sistema econômico: a omissão do preço sobre os custos ambientais. “O sistema de preços é completamente omisso em relação ao impacto cumulativo das nossas escolhas de consumo e de produção”, afirmou.

A deputada estadual de São Paulo, Marina Helou, desenvolveu o núcleo ético do debate em termos claros e replicáveis em políticas públicas. Ela explicitou três vetores conceituais para a transição: a ética da responsabilidade, a ética da coragem e a ética do cuidado. Em sua fala, Marina relacionou essas éticas a medidas concretas de governança, educação e proteção de territórios, defendendo que a agenda climática deve levar em conta desigualdades históricas e específicas de gênero, raça e território. “A implementação só vai acontecer se houver o diálogo e a conversa nos territórios, aonde as mudanças e as emergências climáticas estão sendo vividas e sentidas diariamente.” Sua intervenção realçou a necessidade de articulação entre frentes parlamentares e movimentos sociais para assegurar instrumentos legislativos que traduzam a ética em medidas concretas.

O presidente da Associação da Carta da Terra Internacional – Brasil, Ricardo Young, trouxe a dimensão da escolha individual e cultural ao centro da discussão, argumentando que decisões cotidianas condensam valores sociais: “A opção de viajar de avião ou não viajar de avião é uma opção ética. A decisão de reciclar ou não reciclar resíduos são opções éticas.” Young criticou também o caráter mercantilizante do sistema: “O capitalismo tem muitas coisas boas, mas tem uma falha de raiz que é absolutamente trágica, que é a coisificação de tudo.”

Representando organizações que trabalham com justiça social e clima, Viviana Santiago, diretora executiva da OXFAM, conectada por videoconferência de Nova York, ressaltou a centralidade de uma abordagem interseccional destacando que as políticas climáticas devem reconhecer como raça, gênero, classe e território configuram vulnerabilidades assimétricas. “Como é que isso provoca o nosso olhar e nos faz conectar com essa dimensão do cuidado?” afirmou, ao defender que a transição seja construída em diálogo estreito com as populações afetadas.

A ministra do Meio Ambiente e da Mudança do Clima, Marina Silva, destacou a gravidade da crise climática como expressão de uma crise civilizatória. Para ela, o atual modelo econômico e social chegou ao “princípio do absurdo”, no qual sistemas de produção e consumo ultrapassaram seus limites e passaram a produzir o contrário do que deveriam. “As pessoas passam fome, não é por falta de técnica, é por falta de ética. As pessoas são analfabetas, não é por falta de técnica, é por falta de ética. A gente tem mais energia fóssil, não é por falta de técnica, é por falta de ética”, afirmou. Ao defender que a COP30 seja um marco de implementação, Marina foi enfática: “Depois de 30 anos não tem mais enrolação que se possa fazer. Agora é implementar, implementar, implementar.”

Ao longo do debate, surgiram propostas convergentes: incorporar custos ambientais ao sistema de preços, instituir mecanismos de compliance e sanção que garantam o cumprimento de compromissos internacionais, ampliar canais de financiamento que respeitem direitos territoriais e dar voz e recursos diretos a povos tradicionais e comunidades locais — além de reconhecer que tecnologia e mercado só serão eficazes se guiados por critérios éticos. 

O diretor-adjunto do IDS, Marcos Woortmann, que foi o mediador das perguntas, lembrou que a ética também exige escuta e humildade no processo político. No encerramento, a presidenta do IDS, Dulce Maria Pereira, reforçou a adesão àquelas éticas defendidas pela ministra Marina Silva: “Eu já estou aqui aderindo ao ambientalismo que a ministra Marina propõe. A ministra Marina é sábia, além de extraordinariamente generosa, de coragem e de um compromisso ético cotidiano com o bem viver.” Dulce concluiu destacando a necessidade de seguir o diálogo para transformar recomendações em políticas públicas.


O quarto debate do IDS e contou com a participação especial da Ministra Marina Silva, ao lado do economista Eduardo Giannetti, Deputada Estadual de SP Marina Helou, Diretora executiva da OXFAM Viviana Santiago, presidente da Associação Carta da Terra Brasil Ricardo Young e da vice-reitora da USP Maria Arminda Arruda.

O diálogo reafirmou que a COP30, realizada na Amazônia, será testada não apenas na capacidade de numerar metas e fluxos financeiros, mas na habilidade de converter princípios éticos amplamente aceitos em instrumentos de governança que assegurem justiça, participação e reparação — e, sobretudo, que evitem reproduzir velhas assimetrias sob a aparência da transição.

Acesse ao debate na íntegra no Youtube do IDS aqui.

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